Africanidade, exclusão e leis no Brasil

Por: Roberto Carlos Simões Galvão

Historiadores afirmam que, por volta do ano 1531, teve início o desembarque dos escravos negros no Brasil. Entre 1531 e 1855 foram trazidos cerca de 4 milhões de negros do continente africano (COTRIM, 2001). Trazidos da África pelos navios negreiros, os escravos suportavam toda sorte de violência e privação.

Depois de serem atirados e trancados no porão do navio, os africanos eram marcados a ferro no peito, na coxa ou no ombro. Superlotados, carregando geralmente três vezes mais do que sua capacidade normal, o navio negreiro iniciava a viagem com cerca de 600 escravos. Espremidos nos porões abafados, recebiam pouca comida e um copo de água a cada dois dias. A viagem durava de 35 a 50 dias e cerca de 30% dos escravos morriam antes de chegar ao Brasil. Ao serem desembarcados, os africanos eram separados de seus companheiros de viagem e misturados a outros escravos recém-chegados. Assim, centenas de negros de origens, línguas e hábitos diferentes eram expostos nos mercados de escravos existentes nos três principais portos do Brasil colonial: Recife, Salvador e Rio de Janeiro (BOULOS Jr., 1994, p.64).

A violência cultural se deu posteriormente, pela imposição de costumes ocidentais, catecismo jesuíta, idioma português, tudo em detrimento da cultura própria do povo africano, seus costumes, dialetos, sua maneira de ser e de pensar, suas crenças religiosas etc. Segundo o jornalista congolês Jean Leonard Touadi (apud PALIOTTI, 1998), a violência cultural esteve representada pela teoria da “missão civilizatória” imposta aos povos colonizados para tirá-los das “trevas do primitivismo”.

Somente após três séculos de escravidão teve início um processo gradativo de abolição da escravatura no Brasil com a Lei Eusébio de Queirós de 1850, seguida pela Lei 2.040 de 28 de setembro de 1871 – conhecida como Lei do Ventre Livre -, que libertava todas as crianças nascidas de pais escravos. “Os filhos de mulher escrava nascidos a partir daquela data seriam livres, mas continuariam na condição de propriedade do senhor até os 21 anos de idade” (PILETTI; PILETTI, 2000, p.46).

Mais tarde, em 28 de setembro de 1885 foi editada a Lei 3.270, Lei Saraiva-Cotegipe, garantindo liberdade aos escravos com mais de 65 anos. “[…] além de beneficiar apenas os senhores, que ficavam livres da responsabilidade de alimentar escravos pouco produtivos, a medida era de uma ironia brutal numa época em que a expectativa média de vida para os escravos mal chegava aos quarenta anos de idade” (CALDEIRA, 1997, p.220).

O último país a pôr fim à escravidão no continente americano sancionou a sua Lei Áurea (Lei Imperial 3.353) em 13 de maio de 1888. Na ocasião, não fora proposta qualquer assistência ou garantia que protegesse os antigos agentes do trabalho escravo na transição para o sistema de trabalho livre (FERNANDES, 1965). A libertação dos escravos, da maneira como foi feita no Brasil, impôs aos negros a condição do mais completo abandono. Os ex-escravos tiveram de se reorganizar sozinhos, lançados à própria sorte depois de trezentos anos de escravidão.

Em suma, a sociedade brasileira largou o negro ao seu próprio destino, deitando sobre seus ombros a responsabilidade de reeducarem-se e de transformarem-se para corresponder aos novos padrões e ideais de homem, criados pelo advento do trabalho livre, do regime republicano e do capitalismo (FERNANDES, 1965, p. 05).

Como consequência, ainda hoje é visível o resultado de séculos de escravidão e posterior abandono imposto ao povo negro.

Fonte: http://www.pedagogia.com.br/artigos